O jornalista investigativo

publicado na Ed_07_abr/jun.2018 por

A história do jornalismo investigativo no mundo é complexa, pois, de acordo com diversos autores, o surgimento do gênero se contextualizou em diferentes épocas. O jornalista e pesquisador Solano Nascimento, em sua tese de doutorado “Jornalismo sobre investigações: relações entre o Ministério Público e a imprensa” afirma que as primeiras matérias com denominações investigativas surgiram nos Estados Unidos, logo após a segunda Guerra mundial. Já para outros autores, o gênero surgiu mesmo com força, no final no século XIX.

​A professora e jornalista Cleofe Monteiro de Sequeira também afirma que o jornalismo investigativo começou no Pós-Guerra, principalmente a partir de 1955. Ela acredita que, entre os anos de 1964 e 1973, jornalistas norte-americanos que se posicionavam contra o governo, em consequência da participação dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã, começaram a publicar matérias analisando criticamente a atuação dos políticos. Muitas destas matérias chegaram ao público por meio de revistas como Life e Look.

Ainda, de acordo com a mesma tese, Solano ressalta o trabalho de W. T. Stead no periódico inglês PallMallGazette, de tendência liberal, como um dos exemplos pioneiros sobre jornalismo investigativo. Pois, segundo ele, a partir de 1880, W. T. Stead se dedicou a publicar denúncias sobre exposição sexual comercial e tráfico de crianças e adolescentes, práticas que, muitas vezes contavam com envolvimento e conivência de autoridades e homens ricos.

​No Brasil também é difícil saber o momento exato em que o jornalismo investigativo surgiu. Para Nascimento, um dos primeiros veículos a produzir notícias com características investigativas foi o Correio da Manhã, em novembro de 1923. O jornal nasceu bastante modesto, no Rio de Janeiro (RJ). Fundado por um jovem advogado idealista chamado Edmundo Bittencourt, hoje o veículo é considerado um dos mais importantes jornais brasileiros do século XX. O jornal se caracterizou em uma época em que a imprensa se mostrava mais explicitamente parcial no jogo do poder. Seu caráter era independente, legalista, liberal e doutrinário.

​O autor destaca um exemplo que, a princípio, partiu de uma investigação jornalística, em 1928, com inovações gráficas e de apuração jornalística: A revista O Cruzeiro publicou, nas décadas seguintes, reportagens sobre escândalos políticos, problemas sociais e comportamentais. Na tese de Solano, ele ressalta que o estudioso Juarez Bahia identifica na publicação elementos de um aprofundamento jornalístico sem precedentes no País. As reportagens se caracterizam de flagrantes fotográficos, criatividade e coragem dos repórteres.

​Já para Priscila de Abreu Corteze e Marielle Sandalovski Santos, o jornalismo investigativo começou a ser difundido no Brasil em 1976, quando o jornal O Estado de São Paulo publicou uma série de três matérias com o título: “Assim vivem os nossos superfuncionários”. As matérias mostraram à sociedade a mordomia em que viviam ministros e altos funcionários da corte instalada em Brasília e capitais federais durante o Regime Militar. A reportagem foi escrita por um dos nossos entrevistados, Ricardo Kotscho.

​Outros autores como Mauro Porto e Silvio Waisbord, afirmam que o jornalismo investigativo ganhou força logo depois da ditadura militar. Relatos dos especialistas descrevem que, durante a repressão, jornalistas eram sufocados pela censura e pela força da repressão. Em um dos seus livros, Leandro Fortes afirma que, em 1985, os jornalistas começaram a respirar, a fugir do noticiário oficial e, finalmente, a buscar a melhor notícia, aquela que está escondida.

​A dificuldade imposta pelo regime militar à prática do jornalismo investigativo não equivale a dizer, é claro, que nesse período não houve nenhuma matéria que envolvesse uma apuração mais detalhada, porém, a repressão era grande nesse período, impossibilitando os reportes de produzir matérias de cunho social, como investigar a execução de políticos públicos e práticas de corrupção cometidas por políticos e militares.

Conceitos do jornalismo Investigativo

O jornalismo investigativo consiste em procurar as verdades e versões dos fatos publicados, exige profundidade de checagem, leva tempo e, acima de tudo, não é uma tarefa fácil. José Márquez de Melo, um dos grandes nomes do jornalismo na década de 70, afirma que a investigação não é uma especialidade dentro da profissão, mas que todo jornalismo deve ser investigativo por natureza. “As reportagens investigativas são pautadas pelo interesse público, sobre as grandes questões do País do ponto de vista da população, visando o fortalecimento do direito à informação, à qualificação do debate democrático e à promoção dos direitos humanos.”

​O portal “Jornalismo Comparativo na Internet”, desenvolvido para fazer análises das diferentes abordagens adotadas pelos veículos de comunicação, traz a definição de jornalismo investigativo com a prática de reportagem especializada em desvendar mistérios e fatos ocultos do conhecimento público, especialmente crimes e casos de corrupção que podem eventualmente virar notícia. Mas, o jornalismo por si só não é investigativo? Perguntas como essas são frequentes quando se fala em jornalismo investigativo. Há diferentes opiniões relacionadas ao tema.

​Com a modernidade dos equipamentos e das tecnologias dentro das redações, a investigação deixou de ser uma simples norma e passou a ser uma área especializada em apuração. Ela se transformou em uma espécie de nicho, uma marca e um símbolo de status dentro do jornalismo brasileiro. No Brasil, quando se fala em jornalismo investigativo, logo se faz uma ligação à revelação de escândalos políticos. Para alguns especialistas isso é bastante forte no País. O jornalista Leandro Fortes, também entrevistado em nosso trabalho, em seu livro, concorda com esse ponto de vista. Para ele, o Brasil está atrelado a escândalos e denúncias.

​O jornalismo parte da ideia de que a investigação deve revelar fatos obscuros que a sociedade desejar saber e que o outro não quer que seja revelado. Fazer jornalismo investigativo é algo bem mais complexo, trabalhoso e perigoso. Não se assemelha com a rotina natural das redações. Exige, talento, tempo, dinheiro, paciência e sorte.

​A jornalista Andreza Matais, repórter do O Estado de São Paulo também entrevistada no trabalho, afirma que a investigação de um fato deve partir sempre do desejo do repórter em apurar bem a notícia. “O conceito de investigar não é algo que o jornalista já pega pronto da Policia Federal do Ministério Público ou das fontes de informação. A notícia é tudo aquilo que nasce de uma apuração própria do repórter.”

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Crédito da imagem: CC0 Creative Commons

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